TOP TOP MOMENTOS DE CATARSE ROCK NOS QUADRINHOS

Por Chico Castro Jr.

Rock é catarse, já disseram por aí. Mas afinal, que diabos é "catarse"? Tá lá no Aurélio:

1. Purgação, purificação, limpeza. 3. Efeito salutar provocado pela conscientização de uma lembrança fortemente emocional e/ou traumatizante, até então reprimida. 4. Efeito moral ou purificador da tragédia clássica, conceituado por Aristóteles, cujas situações dramáticas, de extrema intensidade e violência, trazem à tona os sentimentos de terror e piedade dos espectadores, proporcionando-lhes o alívio, ou purgação, desses sentimentos”.

Eu diria que catarse é tudo isso e muito mais: é mandar às favas o bom senso, tudo o que é cerebral e linear, e se deixar levar pelo momento, pela emoção, pelo que se sente - e não pelo que se pensa. Acompanhe comigo agora cinco momentos nos quadrinhos onde os personagens se deixaram levar de modo totalmente catártico e chutaram o pau da barraca - para o bem ou para o mal.

1 - "CABEÇA DE DEUS FEITA DE MÚSICA VIVA" – Pergunte à qualquer nerd: Grant Morrison é um deus dos quadrinhos, todo mundo sabe. E como todo deus, o careca dispõe de poderes muito especiais. E o cara demonstrou isso logo no primeiro número de sua espetacular e revolucionária série Os Invisíveis (lida por pouquíssimos aqui no Brasil, até por que nunca foi publicada por inteiro, como deveria), um dos personagens principais, conhecido como King Mob (Rei Turba), toma um ácido e faz um ritual para invocar o espírito de John Lennon. O resultado, no traço do artista Steve Yeowell, você vê aí nas ilustrações. Clique para ler o textinho e apreciar a arte. O momento é auto-explicatório, desnecessário falar mais. Sobre Os Invisíveis, só o que eu posso dizer é que, apesar de entender pouquíssimo o que li até agora, achei genial e necessário. Na verdade, quem não leu é que tá boiando, mais do que quem leu e não entendeu. Sacou? Os Invisíveis nº 1 foi publicada em maio de 1998 pela Magnum Editora.

2 - "KURT COBAIN ACABA DE DAR UM TIRO NA CABEÇA". Pegue dois losers adolescentes americanos sem porra nenhuma na caixa craniana, dê-lhes pais white trash cruéis ou ausentes, um ídolo suicida e uma doze. O resultado é fácil: mais dois manés seguindo o caminho do líder do Nirvana. Até aí, tudo bem, pena que um deles, mesmo tendo metido um tirombaço nas fuças, não tenha morrido como deveria. Essa é A História de Você-Sabe-Quem, spin off (uma espécie de extensão) da genial série (em 65 números) Preacher, do irlandês psycho Garth Ennis, publicada pela Vertigo / DC nos anos 90. O Você-Sabe-Quem do título é conhecido na sua revista de origem como Cara de Cú (Arseface), e é um dos personagens mais divertidos e perturbadores da série, um grande sucesso que até hoje não foi publicado do início ao fim aqui no Brasil. A História de Você-Sabe-Quem foi publicada no Brasil em fevereiro de 1999 pela Tudo em Quadrinhos Editora. (Ops! Atualização: parece que agora vai: a Devir Editora começou a publicar a saga de Jesse Custer - The Preacher himself - agora em abril).

3 - LISTEN TO THE MUSIC - Angeli é o cara aqui no Brasil. Santo padroeiro dos quadrinhos de humor urbano e underground desde o início dos anos 80, quando começou a publicar suas tirinhas sob o título Chiclete com Banana (nome que foi emporcalhado aqui na Bahia pela banda homônima de axé), Angeli tem inúmeras tiras e personagens que brincam com os estereótipos do rock em suas mais variadas vertentes. Desde o punk de periferia Bob Cuspe aos refugos de Arembepe Wood & Stock, passando pelas desorientadas Luke & Tantra e pelo poser Ritchi Pareide (veja mais abaixo), Angeli pinta e borda tendo o rock n' roll e seus tipinhos como inspiração. Nessa tira específica, de uma série intitulada Listen to the music, vemos o próprio cartunista - dando uma de disc-jockey da sua Rrrrádio Chiclete - perder a cabeça com a insuportável bossa nova, com toda a sutileza que lhe é característica. Nós também odiamos bossa nova, chefe. Listen to the music foi publicada no álbum Mara Tara, Oliveira Junky e outras histórias de Angeli, da Editora Brasiliense.

4 - "PARECE QUE FUI ATROPELADO POR UMA CARRETA" - Todo garoto que foi jovem e rocker nessa vida um dia se apaixonou por uma garota meio doidinha, com a qual costumava circular pelos shows, encher a cara e curtir à beça, mas na hora H, lá vinha a frase fatídica: "Você é um cara super legal e coisa e tal, mas na verdade, eu só gosto de você como amigo". Aaahh, que meigo, é a história da minha adolescência... Atire o primeiro caco de coração aquele que nunca teve vontade de se matar (ou matar alguém) ao ouvir tal frase. Em Meu namoro com Hopey, Jaime Hernandez reconta essa velha história em quatro páginas recheadas de sensibilidade, álcool e diversão. Uma pequena obra prima que conjuga amor, quadrinhos e rock como poucos são capazes. Aproveite que eu tava com boa vontade para scanear essa bagaça e leia-a inteirinha, clicando nas páginas aí. Meu namoro com Hopey foi publicada pela Editora Record na revista Love and Rockets nº 4, em 1992.

5 - "OY! PAUL WELLER! ESQUISITOOOOO!!!!" - Devo confessar que nunca entendi direito as histórias em quadrinhos da Tank Girl, personagem criada por Jamie Hewlett (que depois criaria os Gorillaz com Damon Albarn) e Alan Martin. Vivendo numa Austrália pós-apocalíptica, suas histórias eram meio que um cruzamento esquizofrênico de Mad Max com a supracitada Love and Rockets. Seu namorado era um canguru mutante, que falava pelos cotovelos e enchia a cara de goró com a garota do tanque (não o de lavar, claro). Mesmo não entendendo muito, dava para se divertir adoidado com os argumentos sem pé nem cabeça e com os diálogos travados entre o autor (falando nos recordatórios) e sua personagem. E fala sério, esses cangurus disfarçados de mod e gritando "Paul Weller" já valem o ingresso. Por falar em ingresso, tem um filme baseado na personagem nas locadoras, mas meu conselho é: fuja. Se eu não entendia direito essas histórias, acho que a diretora do filme entendeu menos ainda. Publicada na revista Animal nº 21, da Editora VHD Diffusion, em setembro de 1991.

Quando não está lendo quadrinhos e escutando rock, Chico Castro Jr. escuta rock enquanto escrevendo o blog Rock Loco.

Agradecimentos ao Pedro Henrique dos Santos Costa pelos imagens desta lista.

 

 

 
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