Fanzines
Tem alguns pretensos artistas que são engraçados. Eles nunca fizeram nada, não se esforçam para mostrar o seu trabalho e esperam que alguém um dia bata na porta da sua casa com um contrato para desenhar o Batman em cima de um roteiro do Neil Gaiman. Esse é o tipo de sujeito que se você apresentar um projeto para ele, antes de pensar se sua arte vai ser divulgada, ele quer saber quanto vai ganhar. É alguém que acha que vai começar a carreira desenhando para a Marvel ou a DC. Ou que critica os gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá, dos 10 Pãezinhos dizendo que eles tiveram sorte.
O fato é que esse tipo de pessoa não quer lutar, não quer melhorar, não quer mostrar a sua arte e sim vender e ficar imediatamente famoso. Agora, para aqueles que são dedicados e realistas, existem várias formas de se divulgar um trabalho. Você pode usar a internet (nós mesmo recebemos trabalhos de excelentes artistas, inclusive alguns veteranos, na nossa área de HQ´s), pode tentar os salões de humor, algumas cooperativas e revistas que de tempos em tempos produzem coletâneas. Mas o caminho mais tradicional de todos e ainda muito funcional é o fanzine.
Esse termo surgiu nos anos 30 nos EUA e é um neologismo de fanatic magazine (revista de fanático). A idéia é ser uma publicação independente, sem uma editora formal por trás do material, feita quase que artesanalmente para divulgar textos, quadrinhos e o que mais o autor achar interessante. No Brasil, o primeiro fanzine que se tem notícia foi o Ficção, criado por Edson Rontani em 1965 em Piracicaba, São Paulo. Criado em uma época que o termo que definia produção independente era "boletim", o fanzine trazia textos informativos e uma interessante relação de publicações brasileiras de quadrinhos desde 1905.
Com o tempo, o termo foi se associando mais com quadrinhos do que com outras produções e se tornou, inclusive, uma categoria no Prêmio HQ Mix, além de termos a segunda Fanzinoteca do mundo, em São Vicente/SP. Vários artistas começaram sua carreira em fanzines e uma produção muito boa pode ser encontrada por ai.
Moacir Torres disse em uma entrevista para a gente que o fanzine é o caminho do quadrinhista brasileiro e que, se fosse preciso, ele voltaria a fazer fanzines. Retomando o exemplo anterior, Fábio Moon e Grabriel Bá, hoje dois contadores de histórias (como eles mesmos se classificam) bem reconhecidos e sendo publicados por uma grande editora norte-americana, começaram publicando fanzines. Eles começaram em 1997 com a revista, inicialmente semanal, 10 Pãezinhos. A partir daí eles foram vendendo as revistas, participando de eventos e, aos poucos, conquistando seu espaço. A revista chegou a ter 40 edições e duas histórias publicadas no decorrer dela (O Girassol e a Lua e Meu Coração não sei Porque), que foram posteriormente publicadas em formato de álbum pela editora Via Lettera. Com essas e outras publicação nas mãos, eles foram divulgando a arte deles, participando de convenções de quadrinhos nos EUA, sendo convidados a participar de coletâneas chegando na atual publicação De: Tales, um livro recém lançado nos EUA.
O trabalho deles não só ganhou fama como influenciou outros artistas. Um exemplo que a gente conheceu recentemente são e . Esses dois novatos mostraram que são bem comprometidos e tem muito talento. Já iniciaram com uma excelente série em sete partes chamada Chuva contra o Vento. Esses fanzines contam uma história que pode acontecer com qualquer um: O cara encontra uma garota e se apaixona. Com um roteiro sutil e um desenho muito bom, eles foram, inclusive, indicados para o HQMix. Depois ainda lançaram uma coletânea de quatro pequenas histórias, chamada Sonhos e Olhares e, mais recentemente, Felipe Cunha desenhou Terra do Nunca: Long Song Five, com roteiro de Pablo Casado e publicada pelo grupo de fanzineiros Napalm!
Aliás, a Napalm Comics é um excelente exemplo de pessoas dispostas que uniram forças para divulgar os fanzines que estão produzindo. Sempre com um material de muita qualidade e temática e estilos diversificados, esse grupo tem surpreendido quem acompanha os fanzines.
Os exemplos de publicações independentes são inúmeros. A Fanzinoteca de São Vicente tem mais de mil títulos nacionais cadastrados. Merecem uma menção o Homem-Grilo, um herói cômico que adquiriu um bom sucesso sendo sempre procurado nos eventos que o Cadu Simões comparece, e a Mosh!, uma publicação independente de quadrinhos e rock que já chegou ao número 11 sempre com muita qualidade.
Definitivamente o fanzine é um ótimo espaço para divulgar o trabalho, aprender o que funciona e o que não funciona, receber críticas e elogios. Mas para que o fanzine dê certo não basta fazer, tem que divulgá-lo. Nós sempre ajudamos a divulgar novos materiais, por exemplo. E tem que participar de eventos de quadrinhos, pois lá estará o público que vai comprar suas revistas. Um bom evento para se participar é o Anime Friends, onde ocorre a Fanzine Expo, a maior feira do país.
Para quem não é interessado em produzir mas gosta de ler, também é uma boa dica procurar os fanzines, pois eles são melhores que muitas coisas profissionais e ali pode estar o próximo grande artista de sucesso.